Cartaz do filme
O
tempo pode ser um bálsamo para as feridas e, ao mesmo tempo, um guardião das
memórias. É sob esse prisma que o diretor Arnaud
Desplechin (de Terapia Intensiva),
fez Três Lembranças de Minha Juventude.
O antropólogo Paul Dédalus (Mathieu
Amalric de O Grande Hotel Budapeste),
está de regresso para a França após trabalhar para o governo francês na Rússia.
Ele tem uma namorada russa que diz que gostaria de se lembrar dele quando for
bem velhinha ao que ele responde: “Eu me lembro...”. Esse é o ponto de partida
para as suas lembranças que são divididas em três episódios distintos.
O
primeiro episódio chama-se “Infância”, e começa justamente nesse período de sua
vida. Um período nada fácil, com uma mãe com sérios problemas mentais e emocionais,
a ponto de Paul ter que se armar com uma faca para mantê-la longe, e um pai
ausente, o que o faz ir morar com uma tia que é lésbica e vive com sua
companheira.
O
segundo episódio chama-se “Rússia”. Paul é detido no aeroporto devido ao fato
de haver uma pessoa residente na Austrália com o mesmo nome, data de nascimento
e nacionalidade que ele. Quando era adolescente, Paul (o estreante Quentin Dolmaire) junto com um amigo
judeu, vão até a cidade de Minsky, na então União Soviética, ajudar uma
família, também judia, a desertar. Paul cede seu passaporte a um rapaz que tem mais
ou menos a sua idade.
O
terceiro episódio chama-se “Esther”. Paul já está na faculdade. Ele visita
ocasionalmente seus irmãos que vivem em uma cidade próxima a Paris. Um dia,
conhece Esther (a também estreante Lou
Roy Lecollinet), por quem se apaixona e tem um relacionamento ambíguo.
Exibido
recentemente na 39ª Mostra de Cinema de
São Paulo,
Três Lembranças de Minha Juventude
conquistou o Prêmio SACD da Quinzena dos Diretores do Festival de Cannes deste ano e o prêmio de Melhor Direção de Arte
do Festival Internacional de Cinema de
Chicago (EUA), sendo indicado também para melhor filme. Também recebeu uma
indicação de Melhor Filme Internacional no Festival
de Cinema de Munique (Alemanha). É, de fato, uma produção bem feita, com
excelente fotografia de Irina
Lubtchansky (de História de Judas),
que consegue alternar com competência tons claros (para cenas mais leves) e
tons escuros (para cenas mais tensas).
Os
diálogos e o roteiro, com vários trechos autobiográficos, são do próprio
Desplechin. As partes tem duração desigual. A primeira tem pouco mais de sete
minutos, como se a infância, ao invés de ser um período de descobertas e de
experiências marcantes, fosse algo sobre o qual não vale a pena falar muito.
A
segunda parte é um pouco mais longa, cerca de 20 minutos, no qual o período de
formação de personalidade da adolescência é, simultaneamente, um filme de
aventura e suspense, com o herói agindo de forma correta e generosa.
Já
a terceira parte é a mais longa, pode-se dizer que é o “coração” do filme. O
início da idade adulta é também o início do amadurecimento no qual Paul, como
qualquer jovem adulto, deve fazer a escolha de sua carreira profissional, assim
como a escolha de uma companheira.
O
nome do personagem principal, Paul Dédalus, não foi escolhido por acaso. Tal
como o personagem da mitologia grega, Paul move-se pelo labirinto de sua
juventude, com suas dúvidas e certezas, ás vezes fazendo escolhas certas, ás
vezes erradas, o que o faz perder-se para depois reencontrar-se e perder-se
novamente, em um caminho aparentemente infinito.
Esse
caminho de labirinto faz com que o filme seja um pouco irregular,
principalmente na última parte, com partes arrastadas, principalmente no
relacionamento ambíguo e de vai e vem de Paul e Esther, que, por vezes, cansa o
espectador. É como se o diretor tivesse feito dois filmes de curta-metragem e
um filme de média-metragem e os tivesse colado para fazer o filme de
longa-metragem.
Talvez
fosse uma ideia mais interessante ter três diretores dirigindo as partes com um
tempo mais ou menos igual, tal como foi feito no filme estadunidense Contos de Nova York (1989), que teve as
direções de Martin Scorcese, Francis
Ford Coppola e Woody Allen nos
respectivos episódios. Fosse feito assim, o resultado poderia ter saído melhor.
Três Lembranças de Minha Juventude chega a lembrar o romance realista Dom
Casmurro, do nosso maior escritor, Machado
de Assis (1839-1908), no aspecto em que a história é contada apenas do
ponto de vista do personagem principal – no livro, Bentinho; e no filme, Paul –
sem que sejam conhecidos os pontos de vista dos demais personagens. Daí vem a
pergunta: será que Paul é um narrador confiável?
Ator
favorito de Desplechin, Mathieu Amalric tem uma atuação discreta e segura,
dando credibilidade ao Paul adulto, que, agora, caminha no labirinto da meia
idade. O novato Quentin Dolmaire não se sai mal em sua estreia como o jovem
Paul que caminha no seu labirinto tendo por vezes a timidez e a insegurança
como obstáculos.
Mas
quem brilha é Lou Roy Lecollinet. Bonita, sexy, manipuladora, que sabe de seu
poder de sedução e que o usa sempre que julga necessário. Mas, ainda assim ama
Paul, o que reforça o seu comportamento ambíguo para com ele. A novata Lou Roy
segue a tradição de atrizes francesas belas e talentosas.
Se
colocarmos tudo na balança, veremos que ela pende a favor do filme. Três Lembranças de Minha Juventude é um
bom trabalho do atual cinema francês e que merece ser descoberto pelo público
brasileiro.
RESUMO DO FILME
O
antropólogo Paul Dédalus tem três momentos de sua vida adulta que evocam três
lembranças de sua juventude.
COTAÇÃO
Bom.
Veja o trailer oficial de Três Lembranças de Minha Juventude (Legendado - HD):
Publicado no Observatório do Cinema em 26/11/2015 e no LinkedIn em 1º/12/2015.
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